quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Às vezes o cansaço precisa passar primeiro.


Passei umas boas semanas amaciando a bota. Primeiro dia que usei um pouco mais e estou com calo. Bem, os próximos dias serão em carro. Na próxima cidade grande que eu parar, resolvo isso.
Hoje estou triste e bem desanimada. Por que decidi essa viagem? Eu preciso ficar quieta em algum lugar. Depois dessa primeira fase, vou ter que repensar. Mudar de lugar demanda muito tempo, dinheiro e esforço. Não tem como ficar de lugar e lugar nesse ritmo.
Tô aqui no aeroporto esperando o vôo pro próximo destino, desconfortável, cheia de incertezas então com certeza não estou feliz.
Eu queria que desse pra viajar com a roupa do corpo e pronto. Esse negócio de trem, avião, etc carregando mala é muito desagradável. Já estou na chuva, então não há muita opção.
Só queria que fosse mais fácil.

Escrito em 24/2/24

terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

Cemitério é só um tipo de parque

                        Círculo do Líbano 


Minha câmera chegou. Está carregando enquanto escrevo. Parece que demora até 3h na primeira carga, então amanhã estará pronta.
Hoje amanheceu ensolarado. Não significa quente. Foi o dia mais frio até o momento, mas tinha sol e compôs um cenário bem bonito para um dia no cemitério.
Depois de pegar minha câmera, segui pra estação e peguei o trem/metrô em direção ao cemitério Highgate. Antes de chegar, passei pela igreja de São José. Não sabia que tinha igreja de São José lá. Foi coincidência. Esse foi o segundo ano que participei da promessa. Não pedi nada além de abrir meus caminhos, mas fiz a penitência (alguns escorregões por confusão, mas os crentes disseram que acontece mesmo). Acho que esse ano farei novamente, apesar de ter dito que não faria. Sim, continuo ateia. Só sei que já são quase 2 anos sem pão por causa de São José (exceto pelas vezes que errei).
              'São José, no céu tem pão?' E morreu 

Seguindo. Depois da igreja, tem um parque. É bem bonito, tem dois laguinhos com uns patos. Parece ser bastante usado pela comunidade. Muitos idosos por ali também.

                                Parque de parque mesmo

Cruzando o parque é a entrada pro cemitério. Acabei perdendo um pouco a noção do tempo, mas devo ter ficado por lá umas 3h. É absolutamente lindo e vale a visita pra quem gosta. Eu amo cemitérios e visito sempre. É importante ser respeitoso e lembrar que tem gente ali enterrando os seus mortos. Não é um ambiente de festinha.
Highgate é um cemitério privado. É dividido em duas partes. A mais antiga é linda e estranha. Cheia de artes e história. A mais nova ainda tem vagas, caso estejam procurando um lugar pra descansar. Seu morto mais notório é Karl Marx e sua família. O dia estava lindo. Caiu um pouco de chuva, mas passou rápido.

                              Avenida egípcia 
                                 Cemitério 
                  Workers of all lands, unite!

Como falei, passei tempo demais andando pelos cemitérios. De lá, fui pra uma vila gótica. Ao chegar, descobri que não é aberto à visitação. As pessoas moram lá. Mas olha como é a vida: estava do lado de fora tentando localizar o caminho pro passeio seguinte e sai um cara da vila. Pergunto se é área de visitação. Ele responde que não é, mas diz que deixou o portão aberto acidentalmente e que eu poderia entrar e dar uma olhada, só precisava fechar o portão depois. E me dá uma piscadinha.
                       Vila gótica (Holly Village)

A vila é uma gracinha. As pessoas daqui são muito gentis. Serião. Nunca imaginei que seriam gentis assim. Muito prestativas mesmo. Povo londrino 10/10.
Segui pra estação. Queria ir a Camden, minha última parada do dia. Chegando lá, me surpreendi muito, mas acho que não deveria. Muita gente, muitos jovens, mas também era sexta de tarde e ali é point da moçada (tia vibes).
                      Vista do Camden Market 

Imagino que agora a noite deve estar lotado. Acho que vale uma visita mais longa depois. Fiquei interessada. Comi um chow main com tofu. Achei bem caro, mas foi bom pra dar uma sustância. Aqui, toda comida parece que falta sal e uns temperos a mais, mas tá bom.
De lá segui pro albergue. No metrô, um cara do meu lado estava lendo o alquimista, do Paulo Coelho. Indiquei pra ele Raul Seixas (fora, haters. Aqui é Raul Seixas de criancinha).
Foi um dia longo e cansativo, mas muito bom. Já estou me sentindo em casa aqui.

Escrito em 23/2/24

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

De repente ele era o Jack Estripador

Música: Unsolved Mysteries', Animal Collective

Previsão do tempo: Londres. Dia frio e chuvoso. Não poderia ser mais característico. Acordei cedo e fui. Fui pra onde? Pra mim meio que não importa. Eu sei que estou errada, mas não consigo gostar de fazer turismo em cidade. Pra mim, nada é interessante. "O que são os homens comparados a rochas ou montanhas?" pergunta a irmã de Lizzie e eu. Meu interesse em cidades é super limitado. Toda vez que me vejo acidentalmente numa cidade, meu desinteresse fica mais claro. Não quero ver pontos turísticos. Londres é linda, tem muita coisa pra ver e fazer. As pessoas são muito gentis e prestativas. Tem sido super divertido, mas eu não ligo nem um pouco pra Torre de Londres. Além disso, me sinto roubada nessas atrações pagas. Sim, eu vou ver o palácio de Buckingham e o museu de Londres em algum momento, provavelmente em julho, só não tá na minha lista de sonhos e não me empolga nadinha.
Isso não é uma reclamação, é só uma constatação. Acho importante saber o que se gosta e o que não se gosta. Tirando essa parte de turismo, gostei de tudo em Londres. Obviamente estou perdida 90% do tempo, mas estou confortável. As pessoas são muito prestativas e me ajudaram sempre que pedi e até quando não pedi (acho que o cara do metrô aqui perto vai virar meu melhor amigo).
Hoje um senhor no pub me viu passando e falou 'vai ficar molhada, jovem'. Eu já estava banhada de chuva, me tremendo toda. O desocupado fez a piadinha dele e eu ri porque vou fazer o que? Velho desocupado tem em todo canto e ele me chamou de jovem. Por mim tinha sentado lá com ele pra ficar fazendo piadinha com todo mundo que passasse.
Bem, é isso. As pessoas são gentis, a cidade é ótima. Dá pra andar muito e nunca ver tudo. Metrô, trem e ônibus são muito rápidos e de fácil acesso, mas muito caros. Hoje peguei transporte na ida e voltei andando pra guardar o do jantar. Comprei um guarda-chuva porque não dá mesmo pra ficar sem. Fui à ponte e torre de Londres, ao museu do Jack estripador (100% não vale a pena), andei um pouco por Whitechapel e voltei pro meu albergue na bethnal road. E foi isso. Muito satisfeita enquanto escrevo isso já banhada, deitada na cama e com o radiador me aquecendo e ajudando a secar minhas roupas enquanto chove lá fora. Amanhã pretendo ver cemitério, mas dependo do clima.


Escrito em 22/2/24

domingo, 25 de fevereiro de 2024

Familiarização


O primeiro dia é dia de nada pra mim. Depois de tudo que precisei passar pra chegar aqui e do cansaço excessivo de ontem, só quero ficar tranquila na minha depois de sei lá quantas horas de viagem (se pensar bem, foram mais de 24h no total, da minha casa até o albergue). Pros próximos, vou tentar lembrar que o primeiro dia é dia de ficar em hotel e nada de albergue. O albergue é interessante principalmente pelo preço, mas é sempre mais complicado. Até o banho é um processo. O primeiro dia é dia de organização, descanso e recuperação, no meu caso dessa vez também de cólica e muita dor.
Ontem, na imigração, quase não autorizaram minha entrada. Acharam meus motivos muito estranhos e o tempo de estadia absurdo. Não acreditaram que era turismo. Não consegui explicar que era uma crise de meia idade e que eu queria ver o Liam Gallagher. O problema começou quando perguntaram o tempo de estadia. Daí pra frente, foram muitas perguntas. Tive que mostrar minha conta no banco e tudo.
Estou num albergue exclusivo pra mulheres. Achei o ambiente bem diferente de albergues mistos. Sensação de segurança maior e mais limpo. Pensei que seria a mais velha, mas temos algumas senhoras na casa dos 60/70 (ou talvez 50, mas são brancas europeias rs). Sempre me sinto julgada por estar velha e ficando em albergue, mas, quando chego em um, a real é que nunca sou a mais velha. É muito mais preconceito meu que do albergue. Com relação aos jovens, já fui jovem. Imagino o que pensam. Agora já vivi o suficiente pra saber que não importa. Eles não andaram o suficiente. As pessoas estão por aí viajando e aproveitando o tempo como conseguem. Considerando a quantidade de hóspedes mais velhas aqui, acho que as jovens, se tiveram estranhamento inicial, já normalizaram. São muitas, diria 35%. Estamos aqui e albergue é a melhor opção para viagens longas com orçamento finito.
Além de descansar e recuperar (tô bebendo muita água pra compensar a desidratação de ontem), comprei minha câmera, estou organizando a segunda parte da viagem e tentando fazer meu chip de celular do Brasil funcionar aqui. Sim, tinha resolvido tudo no Brasil, mas cheguei aqui e não funciona. Preciso disso pra minha road trip. Finalmente resolvi que não tem jeito, o teletransporte não existe e passagens custam dinheiro. Comprei tudo e Inverness se aproxima. Já baixei o mapa da estrada offline. Não parece funcionar muito bem, mas mostra as estradas e cidades. Se a TIM não resolver o problema até a viagem, pelo menos não vou ficar perdida demais.
Ainda vou dar uma volta descompromissada hoje. Quero ver whitechapel talvez. Se não der hoje, é o plano pra amanhã. Já são quase 15h, sendo realista, irei pra algum lugar mais perto aqui. Tentar achar algum lugar pra comer. Amanhã será melhor. Espero. Hoje poderia ser considerado um dia perdido se eu  não entendesse a função do descanso.


Escrito em 21/2/24










 
 
 

sábado, 24 de fevereiro de 2024

Se essa rua, se essa rua, fosse minha


Horas e horas de vôo. Cansaço. Muito cansaço. Muita dor também. O piloto anuncia que o avião vai começar os procedimentos de descida. Anuncia também que Londres está nublada. No céu, no horizonte, só vejo um solzão. Tudo azul e brilhante. Abaixo do avião, nuvens brancas. Muitas. Parece um tapete de algodão. O avião está acima das nuvens. Começa o mergulho. Entramos na névoa densa. Saímos em outro mundo. As cortinas se abriram pra um cenário conhecido que eu nunca vi.
(Sim, esqueci de tirar foto na hora certa porque estava admirando as casinhas e só lembrei nessa parte)



Escrito em 20/2/24

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

Lá e de volta outra vez



Lá vou eu de novo. Toda vez é essa confusão. Uma vontade desesperada de ficar, mas os pés não deixam. O erro do Hobbit é criar gosto pela estrada. Tão mais confortável em casa. Três cafés da manhã. Cama macia. Mas aí vem uma inquietação desesperada e o conforto passa a ser prisão. As coisas (eu?) vão morrendo por dentro e tenho que ir.
Ir também não é fácil. Só é pior que voltar. As últimas viagens que fiz, chorei muito quando acabaram. Cada vez mais, meu mundo é na rua.
A idade também bateu forte. Fiz 40 e a crise de meia idade veio com tudo. O tempo tá passando e o mundo é grande demais. Acho que quem tem família tem objetivos diferentes. Ver os filhos crescerem deve dar senso de propósito. O problema é que nunca quis filhos ou família. Meu propósito nasce e morre em mim mesma e não sei se nasci pra ficar no mesmo lugar.
Nada disso facilita a ida. Toda viagem é um balde de incertezas. Dá pra drenar com tranquilidade, mas também dá pra se afogar. No momento, estou a caminho do meu destino. Escrevo esse texto na última quinta antes da viagem. Agendei a publicação para o horário do meu vôo. Já passei pelo afogamento, acho. Estou tentando fechar a mala e percebendo que terei que levar ainda menos do que estava planejando. Levarei uma mala de mão (10kg) e uma mochila (laptop). Preciso ter mobilidade pra ir e vir com facilidade.
A viagem está planejada da forma mais solta possível. Sei que terei que estar em certos lugares em certos dias. O resto está em aberto. Vou decidir com o vento. Nesse caso, acho que é a melhor forma de lidar, mas também posso acabar perdendo tempo e dinheiro demais com idas e vindas desnecessárias. Essa é minha maior fonte de ansiedade: gastar demais e não aproveitar o suficiente. É um motivo estúpido pra me estressar mas nunca falei que eu era inteligente. Vou tentar levar essa viagem com leveza e deixar meus pés me guiarem, mas essa voz me dizendo que eu preciso otimizar todos os caminhos continua gritando.
Quando estava arrumando meu quarto, achei um autógrafo do Zeca Baleiro, de 2001. Nele está escrito 'Para Carol. Canções da estrada. Bjs baleiro'. Talvez as estradas cantem, talvez eu cante pras estradas. Manterei os ouvidos abertos.
Quem quiser, pode vir comigo.