quinta-feira, 25 de abril de 2024

Santos

Igreja de São Francisco de Assis 

Considerando como começou o dia, jamais imaginei que terminaria traumatizada pela Igreja Católica. Vamos começar do começo.
Acordei bem cedo porque hoje é meu único dia inteiro, então queria ver o máximo possível. Café da manhã tomado, segui pra igreja de São Francisco. Tinha que ser a primeira parada. Foi uma excelente escolha porque ainda estava um pouco vazio.

Todas as fotos são do exterior porque é proibido tirar dentro. Muitas pessoas fotografaram. Eu não. Morro de medo de levar grito de padre, ainda mais franciscano.
A igreja é dividida em duas partes: inferior e superior. Foram construídas em períodos diferentes e têm estilos um pouco diferentes. Uma tem arquitetura mais romântica, a outra é mais gótica. A superior é mais alta, a inferior é mais baixa. As duas têm arcos belíssimos e afrescos coloridos. Na inferior, no subsolo, fica a cripta de São Francisco.
Eu gosto de São Francisco. Acho que ele era um rebelde. Só sendo um rebelde pra seguir Cristo como ele seguiu. Por isso, os panfletos entregues pela igreja enfatizando que São Francisco pregava total subserviência ao papado me incomodaram um pouco. Não sou eu que escrevo a história e não estava lá pra ver, mas no meu coração São Francisco é o primeiro punk.
Como eram os santos? Eles eram felizes? Juntavam os amigos pra falar bobagem? Gostavam de passar um dia na praia? A humanidade os tocava? A humanidade os ofendia? Eu sei que as dores eles sentiam, talvez até mais que nós, mas e a felicidade? Não a felicidade transcendental do amor divino, mas a felicidade humana de rir com os amigos e brincar com um cachorro. Eles abriram mão de sua carne? Jesus abriu mão de sua carne? Há leveza na santidade? Há humanidade na santidade (acho que já fiz essa pergunta nesse blog)? Foi isso que ocupou minha mente de igreja em igreja por horas a fio. Conversando com os santos e com o nada.
Chorei um pouco com São Francisco. Rezei. Pedi por nós. Quem sabe tem alguém escutando? Meu cérebro tem um bloqueio grande porque muitas histórias de santo seriam explicados na psiquiatria. O que ainda não se explica é a fé.
Saindo de São Francisco, a decisão lógica era seguir pra basílica de São Pedro, então claro que fui pra Rocca Maggiore. É isso que acontece com gente desorganizada.

Rocca Maggiore 

Rocca é uma fortificação romana construída para proteger a cidade de invasões. Tem vista privilegiada dos vales e montanhas. Fica no topo da cidade, que já é muito alta.
Procurei um tour pra me levar lá no alto. Queria pagar pra não ter que subir com minhas próprias pernas, mas o tour ia demorar uma hora e eu tava lá sem fazer nada então fui andando. Devo ter demorado quase o dobro de uma pessoa normal, mas cheguei.

Visão externa do túnel
Visão superior do túnel 
O túnel que leva pra torre 
Visão da torre. São Francisco lá embaixo.

Depois de subir, era hora de descer. No caminho fica a igreja de São Rufino. É uma igreja simples. Tem um subsolo de pedra com umas criptas. Uma parte do piso é de vidro e permite a visão das pedras sem ter que descer.

São Rufino e crianças brincando 
Em alguma casa. Do rio ao mar, a Palestina será livre.

Passei por outras igrejas. Várias. Entrei em todas, mas não lembro o nome de cabeça e estou com medo de sair do blogger pra procurar e perder o texto de novo (sim, estou escrevendo pela segunda vez e sim, tinha salvado o outro e ele desapareceu mesmo assim e não, não é a primeira vez). De São Rufino fui pra São Pedro. A igreja de São Pedro é a mais simples de todas. Tudo feito de pedra, como Pedro, nada de afresco. Pedra e um Jesus crucificado. Bonita também.
Assis é uma cidade íngreme. A igreja de São Pedro fica abaixo da de São Francisco, então agora eu tinha que subir pra voltar pro hotel. No caminho, tinha uma multidão na frente de uma igreja. Obviamente, entrei. Tinha uma celebração acontecendo então fiquei assistindo um pouco, mas sem entender nada. Vi uns cartazes com o rosto de um jovem, bem jovem. Guri de ensino médio de calça jeans e blusa. Vi um grupo enorme de gente na lateral da igreja, então fui pra lá. E lá estava o menino, embalsamado, deitado numa cripta, com uma fila de gente rezando e pedindo. Estou chocada até agora e talvez esteja sendo desrespeitosa. O menino é um beato, ou seja, já tem milagre confirmado pela igreja.

Mas é um menino e tava lá deitado. Eu não estava preparada pra ver ele assim. Se eu soubesse italiano não teria passado por isso. Fiz uma doação, acendi uma vela, mas não fiquei na fila e não olhei pra ele além do susto. Chocante demais. A Santa Clara já tinha me chocado, mas ela tá ali há séculos. Esse morreu em 2006 com 15 anos. Ele tava de jeans. A família dele ainda tá por aí. Sei lá, talvez eu tenha dificuldade de entender que todo o tempo é história pra algum outro tempo. Mil anos atrás e mil anos pra frente são a mesma coisa. Beato Carlo, que venha sua canonização.
E foi assim que todos os meus questionamentos sobre santidade viraram pó, com um santo menino.
Só me restava continuar a caminhada. Voltei pra Santa Clara pra terminar a visita de ontem. Não tinha padre pra me assustar, mas a igreja estava lotada. Não fiquei muito.
Saí de lá, comi e voltei pro hotel. Cheguei mais de 17h. Tomei um bom banho e vim descansar pra juntar forças pro jantar. Adianto aqui que não tive forças. Vou escovar os dentes e dormir. Amanhã vou pra próxima parada.
Assis foi muito bom. Uma cidade linda. Que venha a próxima.

Escrito em 25/4/24.

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